O PROJÉTIL DE CALIBRE 12


Era manhã de sexta-feira, um tanto sem vontade eu peguei mais um ônibus, lotado como sempre, onde aos poucos movimentos tento pegar algum livro, devidamente me segurando com a outra mão. O que se sucedeu hoje foi um atraso além do normal, pouco antes da metade do caminho o trânsito entrou em estagnação, com direito a pessoas em multidões passeando por pistas e calçadas, um cenário digno de algum blockbuster americano. Porém diferente de como mostrado no cinema, aqui o caos tem consequências críveis, e nosso envolvimento evolui de espectador para participante.
Desci do transporte. Resolvi caminhar ao som enquanto viajava com ”The Blue Danube”. Tive vontade de ficar nervoso, falar uns trinta palavrões que nada resolveriam procurar alguém para culpar... Fui traçando a linha de sempre na mente, em que lembrava o tempo que se fosse 1KM ou 30KM, eu estava sempre montado na minha bicicleta, gostando de guiar literalmente o meu caminho, sem ter que depender de outros e ficar em situações como essa. Me lembrei de uma citação, talvez seja de John F. Kennedy, algo como “Se certifique de na hora de maior tensão, ser o cara mais frio da sala”, e de algum modo pude usufruir de bastante foco e tranquilidade para continuar meus passos no meio de todas aquelas pessoas, que mais lembravam formigas descoordenadas em uma fileira, devido a formiga maior que as comandava ter se acidentado na frente. Eu olhava bem mais de perto, vendo que a maioria preferia sentar e esperar tudo ser resolvido, contra outra parte se divertindo normalmente com esses celulares comuns de hoje em dia que possuem “Whats app”.


Mais a frente e vejo a causa daquilo: Estudantes fecharam o principal ponto da Avenida, que justamente impedia que mais da metade da cidade chega-se ao trabalho. O motivo? Um protesto em relação a medida que o novo governador impôs de não renovar o contrato do Estado com uma empresa de transporte de coletivos dedicada a levar as “crianças” para o Complexo Educacional do Estado (CEPA). Eu já estudei lá, por alguns anos, eu devia ter uns 17 ou 18. Era um inferno esse transporte, peguei ele por umas duas semanas, e na época não trabalhava, vim pedir grana para o transporte para a minha mãe, dizendo a ela dos problemas que esse local tinha, como falta de organização para entrar, gigantesco barulho dentro dele (já que as criancinhas todas não possuíam dinheiro para transporte, mas que por coincidência possuíam todas celulares de ultima geração para tocar reggae ou funk). Preferi caminhar por cerca de três horas para chegar em casa, do que ficar naquilo, após uma semana fazendo isso eu fui ouvido. A vida não é tão simples assim, não basta acontecer algo errado para alguém reclamar, já que isso como eu vejo cada vez mais, quase nunca dá em nada, para eu retomar a multidão, não posso ignorar um simples arquétipo parasita que ronda cada vez mais instituições de ensino: O Comunistinha revolucionário.
Eu não condeno todas as pessoas que tem essa direção politica, condeno sim boa maioria por serem extremamente hipócritas, eu mesmo já tive um professor socialista que é um exemplo de profissional e pessoa para mim, tanto que quando eu terminei o ensino médio, datilografei um bilhete a ele agradecendo pelas aulas, que eu iria começar a fazer Ciências Sociais. E em algum momento no futuro daria aulas de Sociologia e Filosofia. O exemplo desse professor, infelizmente é a mais rara exceção. Ao invés de sair aos trombones promovendo “revolução”, a verdadeira revolução dele era dar aulas de História de maneira inteligente e dinâmica, estendendo o conteúdo para gramática, Direito, nos entregar cultura (Chopin e Chico Buarque eram frequentes em suas aulas) ou mesmo discutir com a sala sobre politica, de maneira questionadora, sem precisar injetar doses de Marx. Além de nas horas vagas ele limpar as salas com alguns alunos, ou mesmo deixar todas as bancas em ordem, são atitudes de alguém que faz a diferença. Claro que para a maioria, um professor como ele é só um desajustado, porque quem eles querem mesmo é “O Agitador.”


O Agitador é em vias das vezes, um ser extremamente politico, popularmente conhecido como alguém que não “dá ponto sem nó”, porém para boa parte dos estudantes, mais centrados em futebol, baladinha ou novela, esse cara passa a ser o redentor. Aprender formalmente sobre leis? Não, isso é “coisa de velho”, diz o Agitador, o certo é ir as ruas clamar o que se quer, não importando os meios para isso. O que choca com a questão de boa parte dos pais não terem estudado ou dado disciplina ao filho, quando não ignorado, e deixado para a instituição educacional à tarefa de ser referencial ético, instituição que permite que agitadores interrompam aulas para se autopromoverem com o disfarce de “estar convocando para lutar por seus direitos”, me fazendo finalmente voltar a cena lamentável que atrasou a mim e milhares: Dois veículos fechando a rua, os agitadores utilizando megafones, com uns duzentos estudantes como escudo. Ninguém poderia passar, ou era agredido. Lojas ao redor? Apedrejadas. Policia tentando negociar? O mesmo. Ao ritmo que eu me aproximava, eles gritavam algo como “Aécio é um filho da puta!” (também não entendi, já que o alvo era o Governador, candidato do PMDB, que por sua vez é coligado com o PT, mas tudo bem, vamos apenas registrar que na mente deles, o Aécio é um “demônio fascista que estava envolvido de alguma forma”).
Enquanto helicópteros traçavam o perímetro, ao longe eu vi um muro preto avançando, e o temor dos covardes que causaram a situação, subindo gradativamente. Ano passado, a cidade estava uma zona maior, qualquer um, estando certo ou não, fechava qualquer rua, fosse uma Avenida ou Rodovia e ficava por isso mesmo. No máximo vinha a Polícia Militar sem muito poder de ação. Mas dessa vez os agitadores se decepcionaram, contando que o novo Secretário de Defesa Social fosse um velho xerife disposto a negociar com terroristas. Em segundos, os agitadores pediram calma aos alunos enquanto a Tropa de Choque avançava, e os alunos? Fizeram como os mutantes em “Cavaleiro das Trevas”, foram atacando de impulso com pedras e garrafas. Me sentei no canto disso para observar o espetáculo, em meio a tantas vezes que é possível se livrar das coisas nesse país, pelo menos eu veria agora alguns “revolucionários” não só limparem a merda que fizeram, mas terem a cara esfregada nela. As bombas de lacrimogêneo iam vindo mais, me lembrei de um amigo meu que virou policial que disse o quanto o fedor é quase insuportável, e ele tinha razão. Todos correram, mas eu não queria, tudo o que eu queria era avançar e chegar no meu trabalho, se eu corre-se teria que fazer um grande contorno, e isso não estava nos meus planos. Continuei avançando, para tentar no canto por eles. Até que senti um peteleco no meu braço direito: uma bala de borracha calibre 12. No calor da emoção eu não tinha raciocinado sobre a falta de inteligência que é avançar sobre eles em um cenário daqueles, onde eu podia ser facilmente confundido com algum bagunceiro. Tive que retomar, chateado por isso, mas recompensado por ter visto que o novo Xerife não vai permitir mais gracinhas desse tipo acontecendo corriqueiramente, que causa voltou a ter efeito, esse é o mundo que eu vivo, são as regras que valem, o crime tem de ser punido, e não tolerado. Não me incomodo nem um pouco em ser chamado de nazista ou algo que o valha por defender que as coisas não podem ficar de graça, e nem mesmo de dizer que nem todo pobre é uma vítima, bem como nem todo rico é um opressor, enxergar o mundo de maneira simplória, só faz com que situações como essa virem um dominó que atinge todos, principalmente os mais pobres como eu e a maioria. Ter força e honra na vida são escolhas, feitas a duras penas, testadas nas suas maiores quedas, e o melhor é que não envolve cor, religião, classe ou preferência politica ou social. O que envolve é a clara atitude de não aceitar ser vítima das circunstâncias.

O QUE O PROJETIL SIGNIFICOU PARA AS PESSOAS AO MEU REDOR?


Abaixo algumas frases que eu escutei tanto na rua, quanto no trabalho sobre o acontecido, cabe a você concordar ou não com alguma delas:

 “Pode não a policia tratar a gente assim, quando eu crescer vou ser traficante pra matar esses filhos da puta.”

“Queria que esse tiro tivesse sido no meu olho, só assim eu tirava uns quinze dias de licença.”

“Vá no jornal local e mostre o braço pra eles, se fosse comigo eu ia lá.”

“Vai na imprensa, o cara indo trabalhar e levar um tiro desses. O governo tem que lhe dá dinheiro, isso ai vale bastante dinheiro.”

“Foi bomba que o tio injetou no braço.”

“Foi uma tatuagem que o tio fez.”

“Chega ai pra eu tirar uma self contigo pra eu colocar no whats app.”

“Com esse povo eles chegam atirando, agora cadê que entram ali nas grotas? Lá é diferente meu amigo, lá ia ter bala pra eles também.”

E aqui alguns links de sites locais que noticiaram:




Essa sequencia de quadrinhos extraída da obra Marvels, resumi bem o meu pensamento sobre o projétil:








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